Uba Budo Trindade, no distrito de Mé-Zóchi, em São Tomé, vive nos últimos dias uma polémica que, segundo os envolvidos, remonta a vários anos, mas que recentemente atingiu novos patamares.
Como diz o ditado, “mais vale um vizinho perto do que um irmão distante”; no entanto, para os envolvidos e respetivas famílias, esse ditado parece um sonho distante.

Segundo o empresário do Distrito de Mé-Zóchi, Anselmo Castro, a polémica começou.
"tudo começou quando eu comprei um terreno que fica ao lado de um terreno que ele toma conta"
Anselmo acrescenta ainda que os ataques não pararam e evoluíram para outros patamares, tendo sido obrigado a apresentar queixa no Comando da Polícia do Distrito.
““Ele começou com provocações, atirava lixo do seu terreno para o meu, e insultava os funcionários que aí trabalhavam. Isso aconteceu desde 2018 até 2023. Chegou a uma altura em que me senti desconfortável com essa situação, então apresentei uma queixa contra ele”, afirmou Anselmo.

Após apresentar a queixa, Anselmo afirmou que não obteve uma resposta positiva, pelo que o empresário recorreu a outras instâncias judiciais para tentar resolver o problema.
“Eu fui surpreendido pela senhora Vice-Comandante quando me informou que não iria haver mais audiência, porque ela não sabia que a queixa apresentada era contra o Presidente da Câmara Distrital de Mê-Zôchi. Disse-me que eu não podia apresentar uma queixa na polícia contra o Presidente da Câmara e que, caso quisesse reivindicar alguma coisa, teria de apresentar a queixa no Ministério Público. Falei com o gabinete jurídico da minha empresa e elaborámos uma petição dirigida a esse mesmo Comando da Polícia, a solicitar com base em que fundamento legal foi rejeitada a minha queixa apresentada contra o Sr. Presidente da Câmara.
Este é o documento que passo a exibir, porque tudo o que eu digo, digo com provas — ao contrário do Presidente da Câmara que, de forma leviana, faz insinuações contra a minha pessoa sem qualquer fundamento. Este documento está datado de 17 de novembro de 2023 e foi recebido, em mãos, pela Vice-Comandante na altura. Até à presente data, os serviços não responderam à petição.” afirmou Castro.

O empresário explicou ainda que foi aconselhado:
“Na altura, o jurista aconselhou-me a fazer uma petição ao Ministro da Defesa. Eu fiz isso, mas, na verdade, lamento dizer-lhe que ainda não obtive respostas destas duas instituições. Qualquer limpeza que eu fizesse no meu terreno, arrumava os lixos e chamava a camioneta para levar o lixo à lixeira. Em nenhum momento mandei lixo para o terreno do senhor.”

O empresário também relatou danos materiais e reforçou que não tem qualquer interesse político nesta situação.
“Eu não sou político, nem quero ser político… É assim, ele anda a perseguir-me e depois aproveita-se dos meios de comunicação social e da aparência que tem, enquanto Presidente da Câmara, para atirar poeira para os olhos dos outros, transparecendo aquilo que não é”, afirma Anselmo Castro.

De acordo com essas alegações, Anahory Dias, cidadão empreendedor e atual Presidente da Câmara de Mé-Zôchi, afirma:
“Não fui eu quem iniciou este conflito, e ele sabe que, quando começou, eu nem estava no país. Quando regressei, em 2019, é que começou a polémica, porque ele tinha adquirido aquele terreno. A minha esposa tentou resolver a situação, mas depois ela não ficou resolvida. Ele fala e eu respondo; para mim, não há mais motivos para isto. Já não havia espaço para consenso, nem para uma conversa mais apaziguadora e tranquila, e eu sempre procurei ultrapassar esta questão”, afirma Anahory Dias.

O recente acontecimento fez aflorar toda a situação novamente, diz Anselmo.
“Na minha residência deixaram o portão aberto e 10 cabras entraram no meu quintal e começaram a comer as bananas. Eu não poderia prender as cabras. Fechei o portão, peguei numa das cabras, levei-a à polícia, e então o senhor teve de aparecer no comando. Eu disse, no comando, que não queria dinheiro do senhor, mas que a única coisa que eu queria era que aconselhassem o Sr. Anahory a fechar as suas cabras, simplesmente isso”, disse Anselmo Castro, em entrevista à Gleba TV.
Por outro lado, Anahory Dias esclareceu:
“Eu sou residente, não sou apenas o único criador. Para vos dizer, recentemente já praticamente não tinha mais nenhuma cabra. Quando vim em 2018, não tinha sequer uma cabra; agora, tenho algumas, que são recentes porque estou a renovar a criação.”

Defende Anahory Dias que as imagens mostradas são de cabras antigas que já nem sequer existem.
"Não sei se isto também tem algum propósito, porque o objetivo da vez é atacar a pessoa do Anahory, enquanto figura do distrito, tentando atingir a minha pessoa. O meu objetivo é, no entanto, evitar ao máximo este tipo de confrontos, procurando ultrapassar os problemas." declara, em entrevista, Anahory Dias.

Uma polémica, sim, entre vizinhos que se alastrou até às áreas profissionais. Anselmo Castro referiu que o quintal do Presidente da Câmara não pode ser um estaleiro público.

“Ele reabilita infraestruturas públicas e pega nos materiais que substituiu por novos, levando-os para o seu quintal. Isso não dignifica em nada a imagem de um presidente de Câmara. O quintal do presidente de Câmara não pode ser um estaleiro público. Se ele reabilitou qualquer coisa, deveria entregá-la à população. Temos casas que ardem aqui, entre outras situações; por que é que ele não entrega os materiais às pessoas?
O relato que chega até mim é que, quando pedem apoio à Câmara, ele diz que a Câmara não tem recursos. Pelo menos, quando realiza estas reabilitações de infraestruturas públicas e retira telhas velhas, deveria identificar as pessoas que precisam — por exemplo, as cujas casas arderam — e oferecer-lhes esses materiais.
Pergunto: a propriedade pública é herança do seu pai ou é um bem público? No meu entender, ele deveria dar outro destino a esses bens. Temos jardins de infância que precisam de lenha para cozinhar para as crianças. Se esses materiais não servem para a obra, que sejam entregues ao jardim para fazer lenha. Tenho provas disso e desafio qualquer um a verificar: o que eu digo está no quintal dele, podem ir lá ver.”
Sobre esta declaração e o desafio lançado, a Gleba TV constatou diretamente no terreno as alegações do empresário e obteve a informação de que, segundo o Presidente da Câmara de Me-Zochi, a retirada dos restos do cercado do jardim no centro da Trindade que o mesmo considera como lenha foi acelerada devido aos festejos de 12 de Julho, no âmbito do cinquentenário da independência.
“Esta é uma questão para mim que não tem qualquer motivo.
Não gostaria de comentar isto, mas vocês estão aqui, podem ver que nós renovámos isto, podem recolher aqui as imagens os restos ainda continuam aqui dentro, que são lenhas à frente da Câmara, deixando todo o entulho ali. É apenas isto que nós recolhemos, como qualquer outro cidadão já recolheu e levou. Nós tirámos isto e colocámos naquele espaço apenas para deixar o local livre.
É uma questão que ele, enquanto cidadão, também, se estiver interessado nestas lenhas, pode vir recolher, pode pedir, não há problema nenhum. Vocês podem ver, não faz qualquer sentido; são lenhas, é lixo. Então, para vocês verem o tipo de pessoa e como é que ele quer levar as coisas, como é que ele busca tudo, para tentar manchar a pessoa do Anahory, enquanto cidadão e enquanto Presidente da Câmara.”

As acusações não pararam, e procederam-se outras revelações, segundo Anselmo.

“Eu produzo lixo na minha atividade e celebrei um contrato com a Câmara, no sentido de recolher regularmente o lixo. Coloquei um contentor em frente à minha porta, mas já há 15 dias que não fazem a recolha, apesar de eu ter pago e ter contrato com a Câmara para o efeito.
Se for para deitar lixo no terreno de qualquer vizinho, claro que vão reclamar. Lixo de cozinha, restos, tudo isso está lá. O problema é que está a cheirar mal. Ele diz que convive com o mau cheiro. É como quem diz que aproveita a sua própria torpeza para tirar vantagem: o estrume das galinhas, que eu recolho na capoeira, representa dinheiro. A procura é tanta que como é que eu vou desperdiçar esse estrume a deitá-lo no lixo ou no rio? Os próprios senhores testemunharam que isso não corresponde à verdade.” Afirma Anselmo.
De acordo com o presidente da Câmara, Anahory, sobre as alegações do seu vizinho Anselmo:
“Uma coisa não tem nada a ver com a outra. E essa é a pergunta que podem fazer aos serviços da Câmara, incluindo ao próprio Governo, que, de acordo com os meios disponíveis para as câmaras distritais, em nenhum país recolhem os lixos domiciliários todos os dias.”

Durante a entrevista à Gleba TV, Anselmo exige uma justificação pelas declarações do seu vizinho, face às últimas declarações do mesmo à comunicação social.

"Na sua reação, face à entrevista que dei na TVS, ele disse que isso é perseguição.
Eu falo com provas, ao contrário dele, e por isso o que eu tenho dificuldade em entender é a razão de considerar isto perseguição. Estamos a caminhar para um momento em que o certo é considerado errado e o errado é considerado certo.
Até para uma pessoa lúcida, isto pode ser confuso.
Dizer para prender a cabra para não danificar o meu gerador dentro do meu quintal é perseguição; dizer para evitar que as cabras defequem na via pública, em frente ao meu portal, também é perseguição.
Gostaria que ele respondesse de forma muito sincera a estas perguntas. Eu nunca participei em nenhum partido; nunca fiz parte de nenhum partido político.
Portanto, a minha grande pergunta é essa perseguição, porquê?"
O cidadão Anahory Dias respondeu.
“Ele tem consciência daquilo que já viveu, Eu tenho de me preocupar com a minha vida daqui para a frente. Não posso continuar com isso, e espero que ele também coloque isso de forma consensual na sua mente, na sua consciência. Como ele disse, não é uma pessoa conflituosa, mas demonstrou-se assim em vários momentos, porque, como vos disse, há cerca de cinco anos que nunca mais dirigi uma palavra a ele; cada um no seu lugar. Ele acusou-me de ter colocado o carro a bloquear a via, como vocês podem ver. Eu não tinha outro espaço para o colocar, senão na minha entrada. Sinceramente, para a minha pessoa, para quem me conhece, o que ele diz não tem nada a ver comigo”, esclareceu Anahory Dias.

Recorde-se que, no trabalho de campo realizado pela equipa da Gleba TV, muitos dos vizinhos dos envolvidos não quiseram identificar-se, mas alguns relataram a invasão de animais às suas residências, a perda de bens e um acidente rodoviário que provocou a queda de um motoqueiro que transportava cartões de ovos. No final, todos da zona demonstraram estar alinhados numa só ideologia e no entendimento para a resolução dos problemas.
“O que eu vejo nesta situação é falta de entendimento, porque o vizinho com a vizinha é irmão, uma coisa dá contigo ou dá com o filho, às vezes quem se dá mal é o vizinho. Não se pode ter esse tipo de comportamento, é muito errado. Porque é assim: o que eu vejo nesta situação é mesmo falta de entendimento, porque já não se olha pelo presidente. Às vezes o Anselmo sai, acontece alguma coisa com o filho do presidente, ele tem de o salvar; se não o salvar, e se ele estiver presente, vai para a cadeia. Outra coisa que acontece é com a família do Anselmo: o presidente está a chegar e ele tem de socorrer. Então, eles têm de criar uma amizade para acabar com essa ignorância.”
disse Maria Zé de Pina, Moradora Nativa da Comunidade, Uba Budo Trindade.
No final das entrevistas, ambas as partes teceram considerações sobre os opositores.
Segundo Anselmo:

“Ele é uma pessoa conflituosa, que não se dá bem com os vizinhos. As pessoas que estão a ouvir esta reportagem e que o conhecem vão concordar comigo. Ele tem várias queixas como funcionário público, e entendo que não está a ser o melhor gestor público, porque usa os bens públicos para o seu proveito, e digo isto como prova. Eu não sou igual a ele.”
Por seu lado, Anahory Dias acrescentou que:

“Vocês vejam como é que ele quer levar as coisas, como procura de tudo para tentar manchar a imagem do Anahory, tanto enquanto cidadão como enquanto presidente da Câmara. A minha decisão, enquanto cidadão, é – e sempre foi – porque eu também tenho família e pessoas que me conhecem sabem que não me guio por esse tipo de princípios, que são de provocação e de causar danos. Ele, enquanto empresário e cidadão nacional, tem os seus negócios; eu também tenho a minha vida privada enquanto cidadão, e devemos respeitar-nos uns aos outros. Em determinadas situações, deve haver consenso. E não continuamos com debates que não beneficiam em nada a nossa sociedade.”
A situação vivida entre o empresário Anselmo Castro e o Presidente da Câmara de Mé-Zóchi, Anahory Dias, em Uba Budo Trindade, reflete um conflito de vizinhança que ao longo dos anos ganhou novas proporções, envolvendo agora questões institucionais e comunitárias.
Enquanto as partes trocam acusações e justificações, os moradores apelam ao diálogo e à boa convivência, lembrando que o entendimento entre vizinhos é fundamental para a harmonia da comunidade.
Resta agora saber se este diferendo encontrará solução pelas vias legais ou se prevalecerá o bom senso e a mediação local para pôr fim a uma polémica que há muito ultrapassou os limites dos quintais.
Jornalista: Varela Tavares
Imagem: Genisvaldo Costa
Fontes:
Anselmo Castro / Cidadão do Distrito de Me-Zochi (Empresário)
Anahory Dias / Cidadão do Distrito de Me-Zochi (Presidente da Câmara)
Maria Zé Meneses de Pina / Moradora Nativa da Comunidade / Uba Budo Trindade
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